sexta-feira, 9 de setembro de 2016

“A Transformação Social – Como a mídia de massa se tornou uma máquina de propaganda”

Prefácio de Heitor De Paola para o livro de Cristian Derosa.

“Os fatos não são adequados para os leitores em sua forma crua, apenas depois de cozidos, mastigados e, então, servidos com a saliva do repórter”.

Arthur Koestler 1
“Para alguns observadores, a imprensa tinha um significado maior dos que os próprios partidos políticos (...). Qual efeito pode ter, mesmo o maior comício, quando comparado com a influência permanente que um jornal diário possui sobre centenas de milhares, ou mesmo milhões  (...) (O povo alemão) recebia as ideias expressadas no seus jornais como um evangelho, não apenas uma fonte de informações, mas como um órgão de instrução....acreditam em tudo o que seu jornal preferido lhes diz....e os homens que devotavam sua vida para informar eram, para eles, grandes homens”.
Modris Eksteins 2

O que está em epígrafe pode ser extrapolado para qualquer grupo humano, em todas as épocas, com as devidas adaptações. Eksteins cita observações de Rudolf Kircher, do Frankfurter Zeitung (1928) e Georg Bernhard (1929). O Partido Nazista aprendeu bem a lição para fundar o seu jornal Völkischer Beobachter e depois para estruturar o Ministerium der Propaganda und Volksaufklärung 3. Aufklärung é a palavra alemã para Iluminismo, não tem, portanto, conotação de simples “esclarecimento do povo”, mas pretendia inaugurar uma forma específica de jornalismo como “iluminação” do povo-raça (Volksdeutsch), um novo Iluminismo, um novo Evangelho racial. Goebbels utilizava desta forma todas as mídias que existiam então - imprensa, literatura, rádio e cinema – englobadas no seu ministério.
Os estados totalitários nada mais fazem do que tornar monopólio estatal a enorme influência da mídia sobre seus consumidores. Não somente para filtrar o conhecimento servido ao povo, mas também para propiciar transformações sociais desejadas pelo grupo que comanda as informações. Como o autor, citando Bernays, nos mostra: “apesar do relativo sucesso da campanha nazista nos meios de comunicação, Bernays salienta que a persuasão encontra seu terreno fértil nas democracias liberais...”.
O vetusto The Times era indiretamente controlado já antes de 1912 pelo Milner Group, que efetivamente assumiu o controle em 1922, com a finalidade de “influenciar a opinião pública na direção desejada pelo grupo” 4. O Milner Group é derivado da Cecil Rhodes “secret” Society. Este grupo pretendia unir o mundo, principalmente os países de idioma Inglês, numa estrutura federal em torno do Império Britânico. Rhodes defendia a acumulação de enorme riqueza para isto, Lord Milner discordava, dizendo que se poderia conquistar o mundo através de propaganda, trabalho duro e relações pessoais. Com o mesmo objetivo fundaram a Round Table, com a finalidade de formar grupos de influência locais para agitação em defesa da “federação” através de “controle da mídia, controle de estatísticas e controle de pânico” 5 (Quigley, op. cit). Antes da década de 20 idealizaram detalhadamente a descolonização e a união das ex-colônias (British Empire) na British Commonwealth of Nations, tornada realidade em 1949.
É desta enorme influência dos meios de comunicação que trata o livro que muito me honra prefaciar. O autor trata com erudição e extrema clareza o objetivo que traçou para si. Ao longo dos capítulos vai desdobrando um mundo que poucos conhecem. Um mundo de grande riqueza e esplendor que, não obstante, se deixa contaminar por vis e torpes propósitos. O autor apresenta ao leitor a estrutura interna, o âmago, aquilo que o leitor comum sequer é capaz de imaginar. Lemos um jornal, assistimos a um programa de TV e, se somos interessados, acreditamos em algumas informações, desconfiamos de outras, tudo de acordo com nossas preconcepções. Parafraseando Koestler, “comemos e deglutimos as informações sob a ação de nossa própria saliva”. Mas os meandros de que trata este livro são desconhecidos do leitor comum.
Algumas partes muito técnicas tornam difícil comentar, mas a leitura é fácil e agradável. Limitar-me-ei a comentários esparsos.
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Já de início, o autor coloca-nos frente a uma característica do novo jornalismo que tem sido ensinado nas universidades, algo desconhecido para a maioria dos leitores: a ideia de que a um jornal, ou outra mídia qualquer, não cabe apenas informar, mas transformar a sociedade, tendo ouvido de um professor que “... o único motivo pelo qual buscamos conhecimento é a vontade de alteração da realidade, a modificação ou controle do nosso meio social”, não como uma conclusão, mas como premissa.
Esta afirmação, em sendo verdadeira, poria por terra não apenas o jornalismo informativo, mas toda a pesquisa filosófica e científica de séculos. Mas só por isto podemos ver qual a base deste ensino: a anti-filosofia marxista. Marx afirmou que “Até então os filósofos limitaram–se a interpretar o mundo. Cabe, agora, transformá–lo”.  Marx pretendia acabar com a filosofia como amor ao conhecimento para, em seu lugar, colocar a práxis – a aplicação da teoria à prática. Chega de investigar! Não mais buscar o conhecimento “para o simples conhecer ou simplesmente para orientar-nos, adaptar-nos, conhecendo as opções disponíveis com vista à ação individual” 6. Prossegue o autor: “Individualmente, ninguém normal busca transfigurar a sociedade à imagem e semelhança de suas utopias. Ao menos este anseio não pode ser visto como natural no ser humano, mas instigado de fora ....”.
Creio que aqui cabe um esclarecimento de ordem psicológica: este anseio é natural em todos os seres humanos na fase de desenvolvimento infantil. A criança muito pequena não aceita adaptar-se ao mundo, mas quer que o mundo se adapte a ela. Revolta-se quando percebe sua extrema fragilidade e dependência, abre o berreiro quando se defronta com qualquer aspecto do mundo real que a frustra. É uma das principais tarefas dos adultos que a cercam ajuda-la carinhosamente a aceitar as crescentes frustrações, de modo que aquelas fantasias onipotentes (utópicas) sejam reprimidas e enterradas profundamente 7. Mas permanecem com o potencial de serem despertadas frente a frustrações naturais. Se persistirem na vida adulta, o que eram fantasias normais, configuram agora um afastamento delirante do mundo real.
Eis que encontramos aqui a crueldade maquiavélica da proposta marxista: apesar da aparência racional e “científica” ela apela tão somente para as frustrações profundamente enterradas em todos os seres humanos fazendo com que elas voltem à tona. Como diz Armando Ribas: “educar com marxismo é como amamentar com álcool”. A analogia é perfeita, pois a ideologia embriaga, ao estimular o retorno das antigas fantasias, já inconscientes, de ser capaz de mudar o mundo a seu bel-prazer. É o perfeito idiota útil (apud Lenin).
A predominância desta estimulação doutrinária no meio jornalístico, pedagógico, artístico e nos consultórios psicológicos é devastadora. Não por outro motivo o autor anunciou no Capítulo II uma nova era, a das técnicas sociais.
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O referido diagnóstico de Karl Mannheim foi precedido por suas ideias sobre ideologia e utopia. Para ele, utopias políticas são wishful dreams que inspiram a ação coletiva de grupos opostos com o objetivo de uma inteira transformação da sociedade e que, para tal dominam o pensamento social penetrando nas teorias científicas, na filosofia, na história e nas ciências sociais.
Pode-se ver ao longo deste capítulo, através de uma dissertação eficiente, como os meios de comunicação caminharam rumo ao controle da opinião pública, não mais da transmissão e informação, como na primeira e na terceira geração da história do jornalismo. Estas me parecem fases ainda inocentes, virgens ainda não estupradas pela ideologia. Mesmo que ”a concepção de jornalismo nesta fase estava na necessidade de orientar socialmente o público”. Esta orientação carecia ainda da malícia que se instalou depois.
Um ponto essencial deste capítulo é a sugestão de Lippmann de que “para serem adequadas, as opiniões públicas precisam ser organizadas para a imprensa, e não pela imprensa” (itálicos meus).  Isso mostra a dependência dos órgãos de informação de uma “instância superior”, a casta dos intelectuais, ou, como hoje abundam, dos especialistas. Os jornalistas já não emitem mais opiniões próprias, mesmo nos editoriais, desde que elas contrariem algum “especialista”.
Acompanho os jornais, e o rádio há quase sessenta anos, e a televisão desde seus primórdios no Brasil. Nunca antes houve a atual enxurrada de opiniões de “especialistas”. Com exceção daqueles que se especializaram em alguma ciência ou um médico, p. ex., estes são, obviamente o que Gramsci denominou intelectuais orgânicos – e Olavo de Carvalho, de imbecil coletivo. A ânsia em demonstrar algo “científico” como se se tratasse de ciências exatas têm levado a ridículos inimagináveis.
Gramsci mantém a ideia marxista do sujeito conhecedor e pensante coletivo, mas faz uma distinção entre o intelectual “orgânico”, aqueles conscientes de sua posição de classe – criado pela classe dos intelectuais, pelo partido-classe – e o intelectual “tradicional” – aquele que mantém sua autonomia e continuidade histórica. A organização da cultura é conseguida exatamente através da hegemonia dos intelectuais orgânicos - organizados como órgãos de um único organismo, o Partido-classe, o “intelectual coletivo”.
Pasmem os leitores, existem especialistas em ética! Ora, uma coisa é ser professor de Ética, examinando o assunto nos textos dos filósofos, outra é utilizar o jornalismo para “ensinar” seres adultos a serem “éticos”. Como bem o diz o autor: “Afinal, há sempre alguma elite de intelectuais ou políticos que acredita ter em suas mãos a solução última, mesmo que a maior parte da população discorde sobre isso. Então, toda a manipulação parece se justificar para o bem supremo de toda a humanidade”. Exemplo recente foi o referendo sobre o desarmamento em 2005: contrariando a auto eleita elite, 63,94% dos brasileiros votaram contra 8. A tal elite, tão pronta a defender a democracia o que fez? Ignorou o resultado como produto de manipulação por parte de interesses escusos dos fabricantes de armas e da “bancada da bala”. Até hoje o Estatuto vige. Outros plebiscitos previstos, como o do aborto, foram rapidamente engavetados! Algo mais importante, que comentarei adiante é o “aquecimento global” causado pelos seres humanos.
Mas este ponto me permite abordar uma das três recomendações do Milner Group acima citados: controle da mídia, controle das estatísticas e controle do pânico. Sendo o primeiro objeto do presente livro como um todo, abordarei agora o segundo. Com referência ao desarmamento são frequentemente publicadas estatísticas de “exatamente quantas mortes foram evitadas pelo Estatuto do Desarmamento”. São citados números assustadores! Os desavisados se impressionam, mas é só pensar um pouco: como surgem estes números tão exatos? Ora, a ciência estatística só pode lidar com dados objetivamente verificáveis. Portanto, como saber quantos assassinatos teriam ocorrido caso não houvesse esta lei? Isto obviamente só pode ser uma interpretação baseada em dados não verificáveis, transformando a ciência estatística numa adivinhação mágica: só com uma bola de cristal que lhes permitisse conhecer o futuro que não foi, mas poderia ter sido, e comparar com o que foi. Por que esta exatidão? Ela tem três propósitos: 1. Dar um ar de cientificismo, 2. Justificar aquela lei ex post facto e 3. Introduzir na mente do público a ideia de que aqueles que querem revoga-las são monstros assassinos, como chamam no Congresso a “bancada da bala”.
Quanto ao primeiro, ressalto o escrito pelo autor em relação à matematização das ciências sociais: “No intuito de serem associadas à cientificidade, e com isso angariar a tão disputada legitimidade social e política moderna, as ciências humanas ocuparam grande parte da sua história tentando aproximar seus métodos aos das ciências exatas”.  Frequentemente caem no ridículo aos olhos dos cientistas e qualquer pessoa de bom senso com alguma cultura 9.
Outro tipo de especialista são autores como os citados Lippmann e Bernays. Esses são técnicos em informação e propaganda, pesquisadores cujas conclusões têm enorme importância para o exercício da profissão.
Outra afirmação com a qual concordo plenamente e que constitui parte importante dos meus estudos, é que “ideias totalitárias são decorrentes de ideias profundamente democráticas”. Por esta razão os framers da Constituição Americana reconhecendo a necessidade da escolha popular das autoridades, impuseram checks and balances, entre eles a eleição indireta do Presidente, a Federação e a subsidiariedade, impediram que lá acontecesse o que ocorreu na República de Weimar. Pelo menos até 2008!
Mas nem só de marxismo vive o livro. As técnicas de Lippmann e Bernays são oriundas de outras paragens, inclusive a necessidade de intensa propaganda empresarial devido ao rápido desenvolvimento da economia de mercado no final do século XIX em diante.
Como diz o autor “O primeiro mito a se desfazer quando se pensa em técnicas de controle social é o de que essas ideias são oriundas de mentalidades ligadas a regimes totalitários. Estes regimes só aperfeiçoaram e deram caráter mais técnico a uma necessidade dos próprios regimes democráticos de caráter liberal”. Devo acrescentar, no entanto, que o desenvolvimento da democracia liberal e da economia de mercado 10 se deu pari passu com a formulação das teorias marxistas. Ambos são filhos do século XIX e as influências entre ambos se interpenetram. Adam Smith (1723-90) e Jean-Jacques Rousseau (1712-78) foram contemporâneos. Seria arriscado falar das influências entre eles, mas viveram o mesmo clima de efervescência do Século XVIII, que culminou nas primeiras aplicações de suas teorias: as do primeiro, na criação dos Estados Unidos da América, as do último na Revolução Francesa. O século XIX presenciou o desabrochar das ideias de Smith na prática política, e as de Rousseau no avanço teórico de Marx e Engels. A primeira aplicação da proposição do Manifesto Comunista de criação de um banco estatal e controle financeiro, entretanto, foi a criação do Federal Reserve System em 1913. Embora essencialmente privado é uma das instituições mais influentes no estado americano.
Sem dúvida os regimes totalitários aperfeiçoaram as técnicas das democracias liberais, mas estas também, a partir de 1917, perceberam a eficácia do controle social na Rússia despertando o sempre latente desejo dos empresários e políticos dos estados democráticos na instituição dos monopólios, como no caso do Federal Reserve que levou à bancarrota milhares de pequenos bancos locais, eliminando a concorrência. À união dos interesses dos magnatas monopolistas com as ideias políticas marxistas gerou o que Olavo de Carvalho denominou de “metacapitalistas”, o paroxismo de poder monopolista.
Um exemplo entre outros é a Gorgovsky Avtomovilny Zavod, a montadora de veículos em Gorki instalada por Henry Ford em 1929. Em troca da instalação Stalin compraria, ao longo de nove anos, 72.000 veículos. Para lá foram componentes, maquinaria e uma equipe de técnicos americanos que permaneciam com os passaportes temporários retidos pela OGPU (polícia política da época, antecessora do KGB). Estes últimos se viram em maus lençóis por causa da baixa qualidade dos materiais e da ineficiência dos trabalhadores soviéticos: acusados de sabotadores já que os trabalhadores locais só podiam ser retratados como heróis, foram parar na Sibéria ou foram executados. Pouco importava para Ford, que auferiu grandes lucros, ou Stalin, que usou a Zavod para implementar a produção de veículos militares.

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Apesar do jornalismo não ser minha área a experiência empírica me mostra que a mídia nos EUA não foi tão afetada pela monopolização como no Brasil. Lá ainda existem os jornais e as rádios locais e aqui estas quase desapareceram. Lá, Reagan se tornou nacionalmente conhecido através de cadeias de rádios locais formadas em grande parte de associações espontâneas, apesar do evidente boicote das grandes redes de TV e dos grandes jornais das metrópoles.
Na minha juventude as cidades interioranas tinham jornais diários e emissoras de rádio. O que foi feito delas? Certamente não conseguiram resistir à concorrência predatória da grande mídia. Já esta última, de tão repetitivas, acabam parecendo a mídia “pluralista” soviética: Pravda, Isviéstia, Krasnaya Zviezda, Komsomolskaya Pravda e outros. Lá, repetiam ad nauseam as ordens do Partido transmitidas pelas Agências Tass e Nóvosti cá, as ordens da ONU transmitidas através de suas diversas agências!
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Ao discorrer sobre os aspectos da cultura e a influência dos intelectuais, o autor nos brinda com excelentes e profundas análises, ressaltando as artimanhas estratégicas dos comunistas na área cultural, principalmente, mas não somente, através da Escola de Frankfurt. Diz o autor: “Ao converterem o capitalismo em um poderoso e temido sistema de manipulação, ocultavam a imensa operação de que faziam parte”. É uma perfeita caracterização de uma das principais táticas comunistas em todas as áreas: "Acuse-os do que você faz, xingue-os do que você é"!
Vejamos um exemplo bem próximo: o PT 11 vivia acusando a todos os demais partidos de corrupção e exclusão social. O que vemos neste primeiro semestre de 2016 é exatamente isto: enquanto acusava os outros, o PT surrupiava tudo que via pela frente e criou a maior exclusão social da história do País. “Nunca antes neste País” houve tanta miséria, tanta corrupção e tanto desemprego.
A influência dos intelectuais frankfurtianos levou à perversão da palavra cultura. No entanto quero aduzir outro personagem: Franz Boas (1858-1942), considerado o pai da antropologia americana, com tal influência no meio acadêmico que hoje ninguém ousa contrariar sua criação, a antropologia cultural. Fundou o primeiro departamento de antropologia dos EUA, na Universidade de Columbia e foi curador de Etnologia e Somatologia no American Museum of Natural History. Seu livro The Mind of Primitive Man (1911) defendia que as diferenças entre as raças não dependiam de fatores fisiológicos, mas de eventos e circunstâncias históricas. Teve seu livro queimado pelos nazistas em 1930, que revogaram seu Ph. D. obtido na Universidade de Kiel, tornando-se imediatamente herói aos olhos de toda a Academia americana. Em 1940 editou Language and Culture.
Seu conceito de que as raças são apenas um construto cultural estenderam-se depois para tudo o demais, apresentando ao mundo o relativismo cultural, esta peste que se espalhou como erva daninha através dos seus principais alunos, Alfred Kroeber, Ruth Benedict, Margaret Mead, Bronislaw Malinowsky e Ralph Clinton. Se tudo é constructo cultural, a realidade se torna impalpável. Foi um prato cheio para as esquerdas que souberam aproveitar suas ideias para “desmascarar” a crença da superioridade da civilização ocidental, considerada racista e xenófoba. Se seu livro foi queimado pelos nazistas é por ser verdadeiro e quem ousa discutir suas ideias é imediatamente um fascista e racista.
Margaret Mead empregou-as em seus estudos de campo com os Maoris, tendo publicado Coming of Age in Samoa e a falsificação da realidade para caber na teoria do mestre foi demonstrada por Derek Freeman 12, entre outros. Tanto Freeman como outros pesquisadores ouviram dos autóctones, objetos da pesquisa, de forma bem irônica, “que se viram forçados a aceitar as teses da autora, tanto ela insistia estar correta”.
Embora a aplicação de suas teorias ao campo se mostrassem apenas confirmações das concepções com as quais ela lá chegou, nada adiantou. O relativismo cultural já está enraizado na mente ocidental de tal forma que a mídia não tem como não repeti-la ad nauseam. Tornou-se padrão mental do ocidente interpretar tudo como “cultural”. Esta noção se espraia para a moral, a religião e tudo que é humano. Elimina-se toda a gradação de valor e, por extensão, a transcendência. Nada mais existe que não seja imanência cultural 13.
Tais conceitos reforçam a tendência ressaltada pelo autor: “Hoje é praticamente impossível encontrar um curso universitário que não tenha como base teórica a crítica ao Ocidente e ao Cristianismo. Uma das evidências disto é que qualquer resquício de moral Cristã nas instituições ocidentais é denunciado como evidência de um poder hegemônico (acrescento: intolerante!) Cristão, capitalista e ocidental. E é justamente esta a técnica de engenharia opinativa utilizada nos meios de comunicação de massa” (meus itálicos).
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Muito do que se sabe hoje sobre propaganda se deve a um personagem, em boa hora citado pelo autor com destaque, aquele que talvez merecesse o Prêmio Nobel de propaganda nos anos entre guerras: William Münzenberg. Tal honraria lhe seria cabida se seu real papel não tivesse permanecido como um segredo guardado a sete chaves. Provavelmente o único comunista alemão oriundo da classe operária, sem pretensões intelectuais, foi o primeiro grande mestre e criador de duas novas formas de serviço secreto: um front propagandístico secretamente controlado e uma rede de “companheiros de viagem” manipulados14.
Münzenberg entendeu que a revolução precisava de algo mais do que ganhar as massas. Numa reunião do Komintern, ponderou: “Precisamos organizar os intelectuais. A revolução precisa dos formadores de opinião da classe média – artistas, jornalistas, ‘pessoas de boa vontade”, novelistas, atores, dramaturgos, humanistas. Lenin imediatamente se opôs, pois estes eram seus mais odiados inimigos. Acabou se rendendo ao argumento de Karl Radek: “precisamos evitar ser apenas uma organização comunista, temos que trazer outros nomes, outros grupos, para tornar mais difícil a perseguição”! (Koch, op.cit.).
Conseguiu convencer meio mundo acadêmico americano e da mídia a criar uma verdadeira rede de propaganda para a disseminação de que, qualquer opinião que servisse aos objetivos da URSS, derivava de elementos essencialmente decentes da personalidade. Simultaneamente, instilar o sentimento, como uma verdade da natureza, que criticar ou desafiar a política soviética era uma marca de maldade, intolerância e estupidez, enquanto o apoio àquelas políticas significava uma pessoa de mente aberta e sensibilidade refinada, desejando o melhor para a humanidade.
Eis aí o germe do que ainda vigora na atualidade: progressistas e reacionários. Os primeiros são abertos às novas ideias, cultos, refinados e tolerantes. Os últimos são grosseiros, intolerantes, truculentos e ignorantes, não sabem pensar corretamente. No idioma russo existe um neologismo para estes: niekultur (inculto).
Esta importância de ter a intelectualidade como “companheiros de viagem” foi uma conclusão empírica genial de Münzenberg, muito antes de Gramsci teorizar a respeito.
Uma lista dos órgãos de comunicação que pertenciam ao “Münzenberg Trust” – como era chamado ironicamente pelos bolchevistas – uma verdadeira multinacional comunista de propaganda com ramificações em todo ocidente não cabe no escopo de um prefácio.  As consequências em Hollywood foram devastadoras. Para aprofundamento, indico, além do já citado de Koch, o livro The Twilight of the Intellectuals: Culture and Politics in the Era of the Cold War, de Hilton Kramer, Ivan R. Dee, 1999. Há uma boa revisão na Boston Review, e um importante artigo do autor sobre as listas negras de Hollywood
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Os principais grupos globalistas ambicionam o controle político e econômico do mundo, e todos sabem que “para alcançar este objetivo há que se controlar a mente humana” (pag.  ). Através das agências da ONU pretende-se criar uma mente globalista, uma falsa identidade internacionalista através da implantação de padrões internacionais de educação, saúde, legislação trabalhista, e tudo o mais. “O inimigo comum de todos os blocos globalistas é a liberdade individual .... Mesmo quando a defendem buscam elevá-la ao seu extremo, o que fatalmente vai expor suas fragilidades”.  A liberdade é um dom muito tênue e frágil e só existe se racionalmente limitada elevá-la ao extremo é esgarçar de tal forma o tecido social que leve ao seu rompimento, criando um vácuo filosófico, moral e religioso. É para preencher este vácuo que entram em cena novos conceitos internacionalistas totalizantes.
Um dos principais instrumentos para a criação destes conceitos e impregnação na mente de todos os seres humanos é o politicamente correto. Dos três blocos globalistas, só o Ocidental pode sofrer intervenção. O Eurasiano e o Islâmico são, por suas próprias naturezas, totalitários e o controle mental está na própria natureza dos regimes. É no Ocidente, onde pela primeira – e única – vez na história da humanidade foi criado o conceito de liberdade individual e, consequentemente, a liberdade de expressão e religiosa, e os Estados Nacionais com suas características específicas.
Porém, o indivíduo livre e consciente sempre existiu, condenado ora como traidor, ora como herege, ora como louco, mas “é de fato impossível de destruir ... (portanto) os grupos revolucionários globais lançam mão de todo tipo de arranjo ideológico para ludibriar a opinião pública e tornar suas demandas de poder e controle num anseio para a humanidade”.
No entanto, como bem o diz o autor, “os intelectuais ocidentais sempre demonstraram intuito de uma sociedade perfeita controlada por uma elite de esclarecidos”. Controlada e planejada, porque não há nada mais oposto ao reinado da liberdade do que o moderno planejamento estatal.
A ideia de um governo mundial tomou força no século XX. A tentativa um tanto ingênua de Wilson de uma paz universal e eterna gerou um filhote natimorto: a Liga das Nações, oficialmente extinta pelos estados totalitários que nem sequer tomaram conhecimento de sua existência. Depois da II Guerra Mundial, Stalin usou seu agente no Departamento de Estado Alger Hiss para planejar uma nova liga, desta vez mais forte e corrigindo os erros da anterior, a ONU. Temendo que os americanos pudessem incluir os direitos individuais presentes em sua Constituição e na Bill of Rights, criaram uma Declaração Universal dos Direitos do Homem, coletivista, globalista e, principalmente, para universalizar de que os direitos naturais não existem, só aqueles direitos que são concedidos pelos organismos globais.
No entanto, a criação de um governo mundial não pode ser imposta de cima, é preciso convencer a humanidade de sua necessidade melhor, fazer com que as pessoas desejem e acreditem piamente que a ideia partiu do seio delas mesmas. Para tal, além da perversão educacional, a importância dos meios de comunicação é crucial, assim como a criação de agendas que mantenham a população permanentemente alarmada, com dizia Mencken. Além deste estado de alarme permanente é preciso de tempos em tempos criar situações fictícias de verdadeiro pânico somente controlado pela “pronta ação da comunidade internacional”, outra ficção. O controle do pânico, lembram, é a terceira recomendação dos fundadores do The Times. Tais agendas são muito bem descritas pelo autor, principalmente o ambientalismo, a ameaça da explosão populacional, de guerras com armas de destruição em massa.
Estas últimas são sempre evitadas por intervenção da ONU, mas poucos percebem que esta organização precisa estimular um estado permanente de guerras localizadas e relativamente controláveis, pelo menos para justificar sua própria existência, assim como o controle populacional. Tal controle através de esterilizações em massa, descriminalização do aborto, incentivo à eutanásia legal, geralmente são, de início, mantidos longe da mídia ou restrito a mídias locais por sua identificação com os projetos eugênicos tão populares no início do século passado, mas tão abominados após o Holocausto. Isto permitiu ao autor, com bela ironia, afirmar: “Distante da cobertura permanente da mídia, torna-se mais fácil desenvolver teorias bizarras como a da eliminação de seres humanos para a salvação da humanidade, sem que perguntas inconvenientes interfiram e atrapalhem...”! (itálicos meus). Mas o que é isto senão uma aplicação da velha estratégia comunista – ou mesmo jacobina? – de matar milhões de pessoas para criar uma sociedade “melhor”? As pegadas do monstro são visíveis!
A exacerbação do ambientalismo e da ecologia fez ressurgir das trevas as velhas ideias sobre Gaia, a Mãe-Terra ou Pacha Mama concedendo a posteriori ares de legitimidade às imposturas satânicas de Madame Blavatsky, Alice Bailey, Annie Besant, Alaister Crowley 15e outros ocultistas.
Embora algumas destas seitas esotéricas se apresentem como cristãs todas têm por objetivo destruir o Cristianismo: “Nossa meta, dizia Madame Blavatsky, não é restaurar o hinduísmo, mas varrer o Cristianismo da face da Terra 16. A grande propagandista do Novo Cristianismo Esotérico, Annie Besant, dizia que “o principal é combater Roma e seus sacerdotes, lutar em todas as partes contra o Cristianismo e jogar Deus para fora do Céu” 17.
Creio que com estas palavras posso recomendar aos leitores a excelente abordagem de Derosa sobre a espiritualidade da Nova Era, onde se estende sobre esta entidade satânica chamada United Religions Initiative e outros movimentos New Age e a “Era de Aquário”, esta última a meu ver fundada com o musical Jesus Christ Superstar, o festival de Woodstock e seu hino é Imagine, cuja letra agrega todos os elementos de uma Nova Ordem Mundial: não haverá inferno nem céu, não haverá países nem religião, uma irmandade de homens partilhando todo o mundo, sem guerras, sem fome, sem posses.
O capítulo sobre o Governo Mundial – Revolução Global e Nova Era – está irretocável, incluindo o papel fundamental da mídia em seu progresso. Claro que, além de não poder ser imposto de cima, também não é possível num único movimento centralizador. Como já expus alhures a estratégia é a da formação de blocos regionais 18 dos quais a menina dos olhos certamente é a União Europeia. Ao escrever este Prefácio tenho uma vantagem sobre o autor: ocorreu recentemente o Brexit, o plebiscito em que o povo britânico rejeitou a União Europeia. Este fracasso de grande monta representa que o povo britânico resolveu banir – espero que para sempre – o jugo de uma casta de esnobes intelectualóides que tem a pretensão de ditar todas as normas para um continente inteiro. 
É bastante revelador o presidente da Comissão Europeia, Juncker, ensinando os políticos europeus em maio passado a ignorar seus eleitorados, dizendo “se vocês estiverem ouvindo a sua opinião nacional vocês não estão desenvolvendo o que deveria ser um sentimento comum europeu 19.
O BREXIT é um enorme revés para a estratégia de colocar políticos e banqueiros elitistas no controle do mundo inteiro.
Deixo as palavras finais com a Iron Lady, ressaltando que são aplicáveis ao mundo todo:

"A Europa é em tudo (exceto no sentido geográfico) uma construção puramente artificial. Não faz sentido mesmo amontoar Beethoven e Debussy, Voltaire e Burke, Vermeer e Picasso, Notre Dame e São Paulo, carne cozida e bouillabaisse, e retratá-los como elementos de uma realidade artística, arquitetônica e gastronômica filosófica musical europeia. Se a Europa nos encanta, como tantas vezes me encantou, é precisamente por causa de seus contrastes e contradições, não pela coerência e continuidade."
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Aprendi há anos com um arquiteto que obra não se termina, abandona-se. E é com pesar que devo aplicar esta máxima a este prefácio. As vertentes são tantas, os meandros tão abundantes e bem descritos que é impossível abrangê-los como merecem. Deixo esta função aos leitores que certamente têm pela frente uma agradável e instrutiva leitura.  Vejo em Cristian Derosa um dos grandes óbices a que a pérfida “transformação social” que denuncia venha a se consumar.

Rio de Janeiro, julho de 2016.
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Notas:
1 Arrow in the Blue, London, 1952
2 The Limits of Reason: The German Press and the Collapse of Weimar Democracy, Oxford University Press, 1975 (Tradução livre)
3 A palavra Volk é geralmente traduzida por povo, mas para a ideologia nazista, seguindo o conceito de Volksdeutsch de Herder, não indica somente uma associação de cidadãos, mas se aproxima mais de uma comunidade tribal considerada como nação.  A palavra tem a conotação de homogeneidade racial.
4 Carroll Quigley, The Anglo-American Establishment, G S G & Associates, California, 1981
5 Estaria aí um embrião do Project Syndicate amplamente comentado por Derosa nos capítulos finais deste livro?
6 Sempre que não houver fonte das citações, estas são referências ao texto do livro.
A “des-educação” moderna faz exatamente o oposto: estimula a onipotência da criança, não frustra, oferece um mundo falso que não a prepara para, na adolescência e na idade adulta, um mundo real inevitavelmente frustrante. Mas há um terrível engano nesta proposição: ao alegar não frustrar consegue é uma frustração de outra ordem e muito pior, ao negar-lhe a noção de autoridade de que carece.
8 Interessante notar a universalidade desta prática: com a vitória do BREXIT os inconformados globalistas exigem que o Parlamento Britânico ignore a vontade dos eleitores britânicos que (se expressaram por 52% a 48%) para retirar o Reino Unido da União Europeia (UE).
9 Como foi demonstrado por Alan Sokal & Jean Bricmont, Imposture Intelectuelles, Ed Ódile Jacob, 1997, com as considerações feitas por Oalvo de Carvalho no artigo Sokal em Portugal”.
10 Prefiro não usar a palavra capitalismo, usada por Marx para caracterizar que na economia de mercado o capital explora o trabalho por se apossar dos lucros, que também maliciosamente chamou mais valia.
11 Há quem negue que o PT seja comunista por causa de um preciosismo de linguagem: eles não se denominam comunistas, e por uma visão antiquada do comunismo teórico que defendia a expropriação e estatização total da economia. Isto é o que o comunismo, na prática, só fez em situações adversas. Acrescente-se um desconhecimento do que trata este livro: este comunismo, que existiu teoricamente, acabou-se em Frankfurt e na Casa Penal Especial de Turi.
12 The Fateful Hoaxing of Margaret Mead: a historical view of her Samoan research, Westview Press: 1999
13 Boas teve, indiretamente, influência de Marx: o maior amigo de sua mãe, Abraham Jacobi, enviou para ela e outra irmã o Manifesto Comunista em 1851. Foi para este “tio” Jacobi que Boas escreveu em 1882 sobre a “enorme transformação intelectual que havia sofrido”.
14 Double Lives: spies and writers in the secret soviet war of ideas against the West, Stephen Koch, Free Press, 1994
15 Crowley está bem vivo no Brasil na “Sociedade Alternativa” fundada por Paulo Coelho e Raul Seixas
16 Declaração a M. Alfred Alexander, publicada em The Medium and Daybreak, Londres 1893, p. 23. (cit. em René Guénon, El Teosofismo)
17 Discurso de encerramento do Congresso dos livre pensadores, realizado em Bruxelas, 1880. (idem)
18 Refiro-me aqui como em todo o texto exclusivamente ao mundo Ocidental, como creio que Derosa também o faz.
19 Oscar Silva-Valladares, The Brexit and How Democracy Works in Mysterious Ways, Geopolitical Monitor, June 30, 2016 (em tradução de William Uchoa)

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